quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

O texto que eu nunca quis ter feito.

Fiz este texto em junho de 2013, em homenagem a um amor meu que partiu. Gosto dele, porque ele fala dela.


Maria do Amor


Escrever sobre o amor é a tarefa mais complexa para os redatores. Ou porque temos muito a dizer, ou porque nosso vocabulário não consegue ser tão rico para descrevê-lo. Neste caso em especial, me faltarão palavras exatas, porque o amor que aprendi com Maria não era exato, pronto, formulado. Era amor intenso, amor em movimento constante, amor vivo, amor único para cada um, amor colorido como o arco-íris e um amor que comia brócolis para ser forte.

Maria semeou amor e replantou corações na gente. Corações que antes de Maria supunham que sabiam amar e que com Maria passaram a amar mais, a amar sempre e amar sem porquês. Maria amava tudo que é divino. Amava, por exemplo, os arco-íris. Simplesmente porque eles lhe encantavam aos olhos e a faziam sorrir. Por amá-los, ela os contemplava, buscava conhece-los e admirá-los do jeito que eles se mostravam para ela, apesar de ser intrigada porque não conseguia encontrar o lilás nos arco-íris daqui. Ainda assim, ela os amava intensamente, porque o amor não vê as falhas, não precisa daquilo que falta e quem semeia amor sabe disso. E mesmo que os arco-íris não estivessem diante dos olhos da Maria o tempo todo, ela continuava amando os arco-íris, e por mais que ela nunca tenha encontrado o lilás neles, ainda assim ela insistia em amá-los, porque o amor não precisa de presenças exigidas, ele transcende o que os nossos olhos podem ver, Maria sabia disso, Maria nos ensinou isso.

Na sua idade de criança, Maria sabia mais do amor que nós que já passamos dos 20, dos 30, dos 40... Quantas vezes com seu raciocínio rápido, sua fala de criança e seu coração intenso ela nos fez parar para pensar que poderíamos ser e fazer melhor. Quantas vezes Maria nos deixou sem palavras, porque o que ela dizia era simplesmente o óbvio, o óbvio que ela percebia com seu coração amoroso e que nós - adultos, vividos - precisamos dos olhos da Maria para abrir os nossos olhos.
O amor tem o poder de abrir nossos olhos para o que é divino. O amor nos dá coragem de olhar nos olhos dos outros. Maria nunca desperdiçou um “eu te amo” sem olhar bem dentro dos olhos de quem ela amava.

Aliás, desperdício não existiu na vida da Maria. Ela nunca desperdiçou tempo, nunca desperdiçou sentimentos, momentos, pessoas... Curtia intensamente as brincadeiras com as Barbies e cuidava delas, porque sabia que elas precisavam estar inteiras para a próxima brincadeira. E a gente, que é gente grande, nem sempre cuida daqueles que nos dão alegria e parceria, né?

Maria tinha zelo por tudo que trazia alegria para o seu coração: as bonecas, os brinquedos, os filminhos, os lápis de cores... E se doava a todos os seres que lhe faziam bem, ela impulsionava um ciclo vicioso de amor... Demonstrava isso em seus abraços calorosos de quebrar costelas nos seus bichinhos de estimação. Aliás, Maria amava tudo que Deus criou... Principalmente, as pessoas.

Ela se dedicou a cada uma das pessoas que Deus colocou na sua vida de maneira única. Quem conviveu com Maria tem uma história exclusiva para contar. Maria elegia as pessoas, ela tirava a gente de um lugar comum e nos colocava em um lugar privilegiado. Porque ela tinha um jeito especial de fazer as pessoas se aproximarem dela e, garanto a vocês, bastava apenas a primeira aproximação para amar Maria imediatamente. Porque a lei do “plantar e colher” é absurdamente certa quando o assunto é amor. Maria semeava amor e naturalmente recebia amor em troca.

Maria não era comum, ela também foi eleita por Deus. Os eleitos fogem do básico. Talvez por isso que Maria tenha vindo com doses caprichadas de inteligência, coragem e força. Para ela não era emocionante dormir toda noite com a mesma estória do João Pé de Feijão e ela recriava esta estória todo dia, tanto que um dia o João chegou a comprar a feijão no CR. Para Maria o emocionante era jogar no celular no nível 19, com o aparelho de cabeça para baixo e ainda não acreditar que os outros eram incapazes de fazer o que ela fazia. Maria não reclamava em comer brócolis, feijão, frutinhas no lanche, contanto que tivesse direito ao melhor biscoito do mundo e ao pão com capituli.

Maria amou tudo que pode ser dela: o balé, os finais de semana com as pimas, os filmes da Valente, a fraldinha para dormir, a casa da vovó, a casa nova. Ela sabia que o que era importante para quem ela amava tinha valor para ela também, por isso comia de garfo e faca direitinho; cumprimentava qualquer pessoa com educação; abraçava a gente com tanta força que dava vontade da gente ficar naquele abraço para sempre; falava com tanta verdade que era impossível contestar suas teorias de gênia de 4 anos.
Tudo na Maria cheirava a amor. Tudo que vinha da Maria vinha com amor. Tudo que lembrava a Maria tinha amor. Tanto que muitos de nós que estamos aqui doamos amor à Maria sem nunca ter recebido um abraço daqueles que dava vontade de ficar nele para sempre. Maria mantém o ciclo de amor hoje e assim será por toda a vida. Por ela houve perdão, houve aproximação, houve doação, houve oração. Uma corrente de amor se formou magicamente entre nós, tanto que estamos aqui mais uma vez, pelo amor que Maria nos apresentou.

Que sigamos com o exemplo da Maria Regina de amar intensamente, principalmente as nossas pessoas. Que nossos abraços sejam dados com tanto amor que as pessoas não queiram nunca mais sair deles. Que a gente cuide dos nossos parceiros, como ela cuidava das Barbies. Que a gente doe o tempo aos nossos amigos com a grandeza que eles merecem, como ele doava seu tempo as suas pimas. Que a gente semeie amor para o máximo de pessoas que a gente conseguir, para que nossos pais tenham no coração a certeza de terem criado filhos de Deus, como os pais da Maria tem. E acho bom a gente se esforçar em fazer tudo isso, porque senão não vamos ganhar nenhuma estrelinha.

Maria agora está com quem a amou primeiro. Onde nós não podemos ir com nossos pés, mas onde nosso amor chega fácil, porque viaja de coração em coração.

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